O objetivo do projeto é superar as desigualdades no campo a partir de pesquisa, desenvolvimento, inovação (PD&I) em Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) visando ampliar a produção e produtividade dos pequenos e médios produtores.

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3 de junho de 2025

Sensoriamento remoto no Semear Digital: tecnologia que aproxima os satélites das propriedades rurais

Por trás de uma simples imagem de satélite, há uma poderosa cadeia de dados, algoritmos e inteligência que vem transformando a gestão agrícola no Brasil. Essa transformação é o que move o trabalho do grupo de Sensoriamento Remoto do Projeto Semear Digital.

A frente de sensoriamento remoto do Semear Digital tem como missão gerar dados, produtos e soluções baseadas em geotecnologias, oferecendo suporte técnico, científico e prático tanto para produtores quanto para gestores públicos. E faz isso de forma multiescalar e multifonte, combinando dados de satélites, de drones e de campo, integrada com a frente de inteligência artificial. Juntos, sensoriamento remoto e inteligência artificial compõem o Eixo 3 do projeto.

“O nosso grande desafio é transformar dados complexos em informações úteis, que ajudem desde o produtor rural a tomar decisões no dia a dia até os gestores municipais e estaduais a planejarem políticas públicas”, explica Édson Bolfe,  pesquisador da Embrapa Agricultura Digital, coordenador da frente de sensoriamento remoto no Semear Digital.

O time de pesquisadores desta linha de pesquisa,  conta com os pesquisadores do IAC, Unicamp, e outros Centros da Embrapa (Meio Ambiente, Pecuária Sudeste, Cerrados, Amazônia Oriental, Uva e Vinho, e Roraima). Além destes, a frente de sensoriamento remoto está formando  alunos de iniciação científica, mestrandos, doutorandos e de pós-doutorando, totalizando aproximadamente 20 pessoas.

De onde vêm os dados?

O sensoriamento remoto aplicado no Semear Digital combina diferentes fontes de dados para compor um quadro mais completo possível. O time utiliza imagens de satélites como Sentinel 1 e 2, Landsat 8 e 9, Planet e RapidEye, além de imagens de drones, dados censitários e dados coletados diretamente no campo.

Essa variedade permite analisar desde características gerais, como o uso e cobertura do solo em um município inteiro, até informações muito específicas, como falhas no plantio, degradação de pastagens, estágio de desenvolvimento de pomares de maçã e até o número de pés de café numa propriedade.

“Quando falamos em sensoriamento remoto, não estamos apenas ‘olhando de cima’. Os dados de satélite são processados e cruzados com informações de campo por meio de algoritmos de classificação digital baseados em aprendizado de máquina,  gerando análises robustas e resultados com elevada acurácia”, explica Bolfe.

Quatro níveis de atuação

O trabalho do sensoriamento remoto no Semear Digital se organiza em quatro escalas principais:

  1. Diagnóstico agroambiental dos DATs: organização e processamento de bases de dados geoespaciais envolvendo aspectos como relevo, solos, recursos hídricos, estrutura fundiária, uso da terra atual e sua dinâmica desde 1985. É a primeira fotografia detalhada do território.
  2. Uso e cobertura da terra atualizada: mapas detalhados para cada município, mostrando áreas de vegetação nativa, pastagem, agricultura, fruticultura, silvicultura, água e áreas urbanas, entre outras
  3. Mapeamento de cultivos prioritários: identificação e caracterização de cadeias produtivas estratégicas em cada DAT. Em Caconde (SP), por exemplo, o foco é o café; em Vacaria (RS), a maçã; em Jacupiranga (SP), a banana; em Breves (PA), o açaí em Lagoinha (SP) e Guia Lopes da Laguna (MS), a pecuária e a recuperação de pastagens.
  4. Análises no nível do talhão: diagnóstico detalhado dentro da propriedade, incluindo identificação de falhas de plantio, adensamento de mudas, formas de manejo, degradação de áreas de pastagens e estresse hídrico.

O projeto incorpora tecnologias de inteligência artificial para melhorar a precisão dos mapeamentos. Algoritmos como Random Forest, Redes Neurais Artificiais (ANN) e XGBoost são aplicados à classificação de imagens, permitindo identificar diferentes usos do solo e estágios de desenvolvimento das culturas com alta acurácia. Além disso, são usados índices espectrais como NDVI, SAVI e EVI, que ajudam a monitorar a saúde das plantas, identificar degradação de pastagens e avaliar a dinâmica do uso da terra.

Impacto direto no campo

O sensoriamento remoto não é apenas uma ferramenta científica. Ele tem aplicações práticas e imediatas no campo. Dados atualizados permitem que os produtores conheçam exatamente o tamanho de suas áreas produtivas, identifiquem áreas degradadas e sua potencialidade para recuperação, ajustem o manejo e planeje melhor seu sistema de produção.

Para os gestores públicos, os mapas ajudam a formular políticas de uso da terra, regularização ambiental, fiscalização e planejamento de desenvolvimento rural. “Quando o gestor tem um mapa detalhado do uso e cobertura da terra de seu município, ele consegue planejar ações ambientais, estabelecer políticas agrícolas locais e até negociar melhor projetos com órgãos estaduais e federais”, afirma Bolfe.

A equipe de sensoriamento remoto está programando  mapear todos os dez DATs do projeto para gerar dados de classificação detalhada do uso do solo, contribuindo também com outras ações do Semear Digital para melhorar o nível de informações  de talhões de plantações nas propriedades, etapa que também configura a interface e apoio com as tecnologias de outros Eixos, especialmente o Eixo de  “Automação e Agricultura de Precisão” e o de “Rastreabilidade”.

O trabalho em Caconde (SP) exemplifica bem a proposta. A equipe mapeou 85 talhões de café em 42 propriedades, identificando quatro estágios de desenvolvimento: café em produção, café recém-plantado, renovação (rebrotas) e esqueletamento (podas intensas).

Em Vacaria (RS), além do mapeamento do uso e cobertura da terra, o foco está nas macieiras, com análises que diferenciam áreas produtivas, em formação e em decadência. Também foram identificadas áreas com culturas complementares, como uva, amora, morango, noz-pecã, batata, soja, milho e pastagens.

Já em Breves (PA), na região amazônica, o foco é monitorar cadeias como o açaí e o mel, além de acompanhar a dinâmica do uso da terra, essencial em um território com forte pressão sobre os recursos naturais.

No caso de Lagoinha (SP), uma das entregas já realizadas foi o mapeamento da vegetação remanescente de floresta, fundamental para ações de regularização ambiental e planejamento da recuperação de pastagens degradadas.

Essas e outras ações têm gerado dezenas de publicações de trabalhos em congressos regionais, nacionais e internacionais, além de artigos científicos em revistas internacionais de alto impacto, que podem ser acessados no Repositório de Publicações da Embrapa (https://www.alice.cnptia.embrapa.br) e também no Portal Semear Digital (www.embrapa.br/semear-digital).  Da mesma forma,  os dados produzidos estão sendo organizados e serão disponibilizados por meio da plataforma Repositório de Dados de Pesquisa da Embrapa (ReDAP), garantindo acesso livre para pesquisadores, técnicos, gestores e produtores. A proposta é que essa base de dados geoespaciais ajude não só o Semear Digital, mas também outros projetos de pesquisa e políticas públicas.

Desafios no radar

Apesar dos avanços, o projeto enfrenta desafios técnicos e operacionais. Entre eles, a necessidade de melhorar a conectividade no campo — essencial para acessar e compartilhar os dados — e a capacitação dos usuários para interpretar e utilizar as informações geradas.

Além disso, o mapeamento em áreas de vegetação densa, como o açaí em áreas na Amazônia, ou de cultivos com características espectrais semelhantes, como certos grãos ou  pastagens, exige a constante melhoria dos algoritmos e da integração entre dados de diferentes sensores, inclusive radar.

“Muitas vezes, os dados oficiais como os do IBGE, apresentam certas dificuldades para  refletirem a realidade no nível local com a temporalidade necessária. O sensoriamento remoto ajuda a reduzir essa assimetria de informação, porém, demanda trabalho de campo com a participação ativa dos atores locais, ajustes metodológicos e processamento digital complexo”, destaca Bolfe.

Para 2025, a agenda do grupo prevê campanhas de mapeamento em Boa Vista do Tupim (BA), Lagoinha (SP), Jacupiranga (SP) e uma nova rodada em Breves (PA). A proposta é consolidar os mapeamentos, gerar produtos aplicáveis a políticas públicas, fornecer dados e informações para prefeituras, cooperativas, associações e sindicatos de produtores rurais, e integrar ainda mais os dados de sensoriamento remoto com os demais eixos do projeto.

“A nossa missão é que o sensoriamento remoto deixe de ser visto como uma tecnologia distante e passe a ser uma ferramenta cotidiana na mão dos produtores e dos gestores envolvidos no Semear Digital”, conclui Édson Bolfe.

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